terça-feira, 22 de novembro de 2016

Uma Falácia Ateísta


UMA FALÁCIA ATEÍSTA


Uma falácia ateísta diz que: “E impossível que o universo tenha uma explicação” Assim, alguns defensores do ateísmo tentaram arrumar uma justificativa para fazer do universo uma exceção. Eles disseram que é impossível que o universo tenha uma explicação para sua existência. Por quê? Porque essa explicação teria que ser um estado de coisas anterior no qual o universo ainda não existia. Mas isso seria o nada, e o nada não pode ser a explicação de algo que existe.

Assim, o universo deve somente existir, de forma inexplicável. Essa linha de raciocínio é uma evidente falácia. Pois ela assume que o universo seja tudo o que existe, de modo que se o universo não existisse, haveria o nada. Em outras palavras, a objeção presume que o ateísmo seja verdade! Os ateístas, portanto, estão cometendo uma repetição de princípio, argumentando em círculos.

Leibniz concordaria com a colocação de que a explicação do universo deve estar em tal estado de coisas anterior à existência do universo. Mas esse estado de coisas anterior é Deus e sua vontade, e não o nada. Parece-me, portanto, que a  premissa de Deus como causa da existência do universo, em termos plausíveis, é mais verdadeira do que falsa, e isso é um bom argumento.


Willian Lane Craig

Em Guarda. Porque as coisas existem? p.59-73, 2011.

sexta-feira, 18 de novembro de 2016

A Vida em Teoria de Stephen Hawking


A VIDA EM TEORIA DE STEPHEN HAWKING

Recente filme sobre a vida do famoso cientista britânico Stephen Hawking suscitou uma interessante análise que foi publicada no nº 324 da revista Ciência Hoje publicado em maio de 2015. Nessa análise, o pesquisador brasileiro Prof. Felipe Tovar Falciano, do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas, ressalta que o filme, intitulado “A teoria de tudo” dá mais destaque à biografia do físico britânico do que à sua busca por uma equação capaz de explicar todos os fenômenos da natureza. Julgamos de interesse para nossos leitores o conhecimento dessas considerações, pelo que transcrevemos a seguir o texto publicado naquela importante revista de divulgação científica.

O filme A teoria de tudo” tem como enredo principal a vida do físico britânico Stephen Hawking. Hawking é conhecido não só por seus trabalhos em cosmologia e física de buracos negros, mas também por sua doença, que acabou por colocá-lo dentro de um estereótipo de gênio com cérebro brilhante em condições físicas limitadas.

O título do filme é uma menção direta à ideia das chamadas “teorias finais”, as quais seriam capazes de explicar todos os fenômenos da natureza com um único formalismo. A afeição de Hawking por esta ideia aparece no filme, por exemplo, quando ele faz uma pergunta retórica a Dennis Sciama, seu orientador de doutorado: “não seria bom se houvesse uma simples equação que pudesse explicar tudo?” Mas infelizmente, até o momento, as teorias de unificação são apenas um pote de ouro no fim do arco-íris.

É verdade que na Física moderna encontramos exemplos de unificação entre teorias outrora independentes. O próprio eletromagnetismo é em si a unificação dos fenômenos elétricos e magnéticos que, antes do século 19, eram entendidos como manifestações independentes. Outro exemplo é a “teoria eletrofraca” – com validade para altas energias – que unifica o eletromagnetismo e as interações nucleares fracas (responsáveis pelo decaimento radiativo).

Podemos apontar pelo menos três contribuições de peso acertadamente salientadas no filme. Hawking contribuiu de modo significativo no desenvolvimento dos teoremas de singularidade aplicados à cosmologia, fez a proposta pioneira de que buracos negros emitem radiação térmica (hoje chamada de “radiação Hawking”) e publicou trabalhos relevantes na área de cosmologia quântica, área fenomenológica que descreve o passado remoto do universo e na qual a gravitação é uma interação quântica.

Essa aspiração pela “teoria de tudo” se afina, embora não tenha nenhuma relação direta, com a explícita postura cética do cientista ateu. Em um dos momentos finais do filme, Jane, sua então mulher, lê uma passagem do livro Uma breve história do tempo” em que Hawking parece rever sua postura de cético ateu. Ela pergunta com ar de surpresa se ele passou a reconhecer a presença divina. A cena é bem construída e pode deixar dúvidas pelas reticências de Hawking, mas seu silêncio provavelmente é apenas mais uma amostra de seu respeito e carinho por Jane.

Apesar do título escolhido, o filme não desenvolve o assunto de “teorias de unificação”. A trama tem um enfoque pessoal, centrado nas relações e nos desdobramentos da vida do casal. A história foi inspirada no livro Travelling to infinity: my life with Stephen, escrito por Jane, o que nos permite reinterpretar o título como as visões e lembranças (a teoria) dos fatos e acontecimentos (de tudo) na vida de Jane e Hawking.

Para os amantes de ciência, é inevitável a atração por assistir “A teoria de tudo”. Por isso, vale ressaltar que há pouca informação sobre os trabalhos de Hawking no filme. Alguns diálogos são inteligentes e sarcásticos, como a explicação de Hawking sobre o que é cosmologia. O leitor não deve esperar um filme melodramático; ao contrário, existe não só um tempero refinado e bem equilibrado, com pitadas de humor, delicadeza, demonstrações de estima e respeito mútuo, mas também a narrativa da difícil luta contra uma doença avassaladora.

O retrato caricato da vida acadêmica não é muito original e tem, como sempre, mitificações e endeusamentos, embora não prejudiquem o bom andar da história. E como a abordagem dos temas científicos é escassa, fora um detalhe ou outro, não há qualquer ressalva quanto aos conceitos descritos no filme. Contudo, é praticamente impossível abordarmos temas como buracos negros, início do universo e natureza do tempo sem aflorar o interesse até dos mais apáticos. Assim, me vejo absorvido pelo desejo de comentar os assuntos relacionados aos três trabalhos mais famosos de Hawking, mesmo que brevemente.

O modelo padrão da cosmologia descreve um Universo em expansão a partir de um estado extremamente quente e denso no passado. A expansão cuida de esfriá-lo e sua densidade diminui com o passar do tempo. Porém, ao olharmos para o passado, deve ter havido um momento em que a temperatura e a densidade do Universo se tornaram infinitas, o que chamamos de “singularidade inicial do modelo” – erroneamente, essa singularidade chegou a ser interpretada como o início do Universo.

Na ciência, os modelos são simplificações necessárias para descrever as propriedades mais relevantes de um sistema. Assim, cogitou-se que essa singularidade fosse apenas um problema da simplificação usada no modelo cosmológico. A contribuição dos teoremas de singularidade foi mostrar que a presença da singularidade inicial do modelo cosmológico é uma propriedade genérica. Em condições pouco restritivas, a singularidade deve estar presente em todos os modelos cosmológicos.

Um buraco negro é um objeto astrofísico que tem um horizonte de eventos. Esse horizonte atua como uma membrana que só deixa passar em uma direção (entrando no buraco negro). Nada pode escapar dessa região, nem mesmo a luz, e, por isso, o nome buraco negro. A novidade proposta por Hawking foi que, ao interagir com campos quânticos, os buracos negros podem emitir uma radiação térmica cuja temperatura depende do inverso da massa do buraco negro – ou seja, quanto menor a massa de um buraco negro, mais rapidamente ele evaporaria. Esse trabalho inovador serviu de base para novas linhas de pesquisa – por exemplo, a analogia entre as propriedades dos buracos negros e as leis da termodinâmica.

Por fim, a cosmologia quântica foi uma das áreas extremamente influenciadas por Hawking. Esse campo de pesquisa descreve modelos de universo em uma fase em que efeitos de gravitação quântica seriam dominantes.

No filme, Hawking menciona que não há fronteiras para a diligência humana (“there are no boundaries to human endeavor”). Tal citação se conecta com uma proposta feita pelo cosmólogo em que o Universo seria descrito por um estado sem condições de contorno (boundary). Essa é uma ideia elegante que pretende evitar o problema da arbitrariedade das condições iniciais em cosmologia. Entretanto, a ideia de Hawking acaba por ser apenas uma nova proposta de condição inicial do Universo.


Extraído.

Boletim SCB. Ano III, n.36, junho de 2015, ps. 21-24.
Carlos Carvalho
Pesquisador autônomo

quinta-feira, 3 de novembro de 2016

O modelo=padrão para a origem do universo está correto?


O modelo-padrão para a origem do universo está correto?

Afinal, esse modelo está correto ou, o que é mais importante, ele está correto em prever uma origem do universo? Já descobrimos que o desvio da luz vermelha vinda de galáxias distantes fornece uma forte evidência do big bang. Além disso, a melhor explicação para a abundância de certos elementos no universo, como o hélio, está na tese de que eles foram formados em um denso e quente bing bang.

Por fim, a melhor explicação para a descoberta, feita em 1965, de um background cósmico de micro-ondas de radiação é considerá-lo como um vestígio do big bang. No entanto, o modelo-padrão do big bang precisa ser modificado de várias maneiras. Ele é baseado na teoria geral da relatividade formulada por Einstein. Mas essa teoria cai por terra quando o espaço é reduzido a proporções subatômicas. Precisamos introduzir nesse ponto a física subatômica e ninguém está bem certo de como isso deve ser feito. Além do mais, a expansão do universo provavelmente não é constante, como no modelo-padrão.

Ela provavelmente foi acelerando e teve um breve momento de uma expansão extremamente rápida no passado. Mas nenhum desses ajustes precisa afetar a previsão fundamental de uma origem absoluta do universo. Na verdade, os físicos têm proposto diversos modelos alternativos ao longo das últimas décadas, desde o trabalho apresentado por Friedman e Lemaitre, e provou-se repetidamente que todos os modelos que não se baseavam em uma origem absoluta não eram viáveis. Colocado de forma mais positiva, os únicos modelos fora do padrão que são viáveis são os que envolvem uma origem absoluta do universo.

Essa origem pode ou não ter tido um ponto inicial. Mas mesmo teorias (como a Stephen Hawking que defende a “não existência de limite”) que não têm um ponto como origem, ainda assim têm um passado finito. Segundo essas teorias, o universo não existiu desde sempre, mas veio a existir, ainda que isso não tenha acontecido num ponto precisamente definido. Em certo sentido, a história da cosmologia do século XX pode ser vista como uma única tentativa repetida em série, uma vez depois da outra, de evitar a origem absoluta prevista pelo modelo-padrão do big bang. Infelizmente, fica a impressão aos olhos dos leigos que o campo da cosmologia está sempre dando voltas sem nunca chegar a resultados duradouros. Mas o que os leigos não entendem é que essa enorme fila de teorias falhas serve apenas para confirmar o que foi previsto pelo modelo-padrão: que o universo veio a existir.

Essa previsão tem permanecido de pé por mais de oitenta anos, ao longo de um período de enormes avanços da observação astronômica e dos trabalhos de criação teórica da astrofísica. Na verdade, em 2003 parece que chegamos a uma espécie de divisor de águas, quando três proeminentes cientistas, Arvind Borde, Alan Guth e Alexander Vilenkin, conseguiram provar que qualquer universo que, em média, tenha estado em expansão ao longo de sua história não pode ser infinito em seu passado, mas têm obrigatoriamente que ter um limite de espaço-tempo passado.

O que torna a prova deles tão potente é o fato de que ela se sustenta independentemente da descrição física do próprio universo de origem. Por não termos ainda como fornecer uma descrição física do próprio universo de origem, esse breve momento tem sido terreno fértil para as mais diversas especulações. Um cientista o comparou com aquelas áreas dos mapas antigos onde tem uma legenda “Aqui devem ter existido dragões!”, ou seja, é alvo dos mais diversos tipos de fantasias. Mas o teorema de Borde-Guth-Vilenkin independe de qualquer descrição física daquele momento inicial. Fica implícito no teorema deles que mesmo que nosso universo fosse uma parte minúscula de um suposto multiverso, composto de muitos universos, esse multiverso deve ter tido uma origem absoluta. Vilenkin é franco acerca das implicações:

“Diz-se que um argumento é algo que convence pessoas razoáveis e uma prova é algo que convence até mesmo quem não é razoável. Com a prova agora em seu devido lugar, os cosmólogos não podem mais se esconder atrás da possibilidade de um universo de passado eterno. Não há como escapar: eles têm que encarar o problema de uma origem cósmica.”

William Lane Craig

Em Guarda, 2011, p.99-101.