Bíblia & Ciência
estrita
Espero não ser
mal compreendido com o que escrevo pela comunidade de cristãos que como eu, têm
fé sincera em Deus e em sua Palavra. Sou um homem de fé, sou cristão há mais de
duas décadas, minha primeira formação é Teologia e, portanto, falo a partir do
meio onde vivo e partilho as minhas convicções.
Durante os
séculos que chamamos de idade medieval, que certamente se encerrou com o
advento da Reforma Protestante, a Igreja Católica detinha o controle das
produções científicas e artísticas do mundo que governava. Politicamente e
espiritualmente possuía o destino das vidas de milhões de pessoas no mundo de
então. Era um poder que poucos desejariam desafiar.
Neste período,
mesmo que equivocadamente tentando proteger a fé em Deus (isto por parte de
pessoas sinceras que criam de fato nisso, sem mencionar os oportunistas e
profanos), essa instituição declarava que as Escrituras era um compêndio não
somente de textos revelacionais sobre Deus e seu Cristo, mas também era uma
obra de cunho científico, ou seja, adotavam um literalismo bíblico mesmo em
questões de ciências.
Ainda hoje
esse literalismo bíblico em questões científicas sobrevive e têm adeptos mesmo
no meio Protestante e evangélico. Mas a Bíblia não é um livro de assuntos
científicos. Mesmo crendo que de fato em suas poucas declarações de ordem
científicas ela seja verdadeira, a realidade é que ela se interessa por
assuntos como a revelação de Deus, sua relação com o homem e Israel, o
conhecimento de Jesus Cristo e a prática da vida piedosa.
Nestes últimos
dias tenho lido alguns textos interessantes sobre Calvino e me ative o quanto
seus escritos são importantes, mas poucos conhecidos do povo em geral e também
dos cristãos atuais. Impressiona-me a sua Teoria da Acomodação, que ele
descrevia como um forma de libertar a Bíblia do literalismo da época e para
libertar as ciências dando a ela curso livre na busca pela descoberta sobre os detalhes da criação.
Sobre esse
aspecto particular apresento algumas porções de textos e frases de Calvino e de
outros cientistas que, como ele, tinham uma percepção mais acurada da relação
entre a Bíblia e a ciência que nos falta hoje. João Calvino disse:
O ponto
principal das Escrituras é trazer-nos a um conhecimento de Jesus Cristo... As
Escrituras nos proveem com um espetáculo, através do qual nós podemos ver o
mundo como a criação de Deus e sua autoexpressão; elas jamais pretenderam
prover-nos com um repositório infalível de informações astronômicas e médicas.
Alister McGrath,
comentando a teoria da acomodação de Calvino a resume assim:
Deus, ao se
revelar a nós, acomodou-se aos nossos níveis de entendimento e às nossas
preferências naturais por meios ilustrativos de compreendê-lo. Deus se revela,
não como ele é em si mesmo, mas em formas adaptadas à nossa capacidade humana.
O famoso astrônomo
Phillips van Lansbergen (1562-2632), comentando as Escrituras escreveu:
...segundo a
situação real, mas segundo as aparências...a Escritura foi-nos outorgada por
inspiração de Deus, e deve ser usada para doutrina, exprobração, correção, e
para o exercício da probidade, mas não é própria para o ensino da geometria e
da astronomia.
Johannes Kepler
também escreveu:
As Sagradas
Escrituras falam sobre coisas comuns (no ensino daquilo para o qual elas não
foram instituídas) a criaturas humanas, numa maneira humana, para que possam
ser compreendidas pela humanidade; elas usam o que geralmente é reconhecido
pelas pessoas, a fim de fazê-las entender outras coisas, mais elevadas e
divinas[1]
O pensamento
de Calvino encontrou reflexo até nos escritos de Isaac Newton (1643-1727) e de
muitos cientistas cristãos de sua época e posterior. Por isso minha tendência é
a de concordar com esses homens que não somente fizeram história com sua vida,
estudos e escritos, mas mudaram a própria História da ciência e do mundo
Ocidental.
© Carlos Carvalho
[1] Todas
essas citações retirei de um excelente artigo de Wilson Porte Jr. no site da revista
Teologia Brasileira. No artigo há todas as referências bibliográficas das
declarações. Disponível em: http://www.teologiabrasileira.com.br/teologiadet.asp?codigo=350
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