terça-feira, 13 de dezembro de 2016

O Argumento de Leibniz 2

O Argumento de Leibniz 2

Primeira Premissa
Tudo que existe tem uma explicação para existir.

Uma objeção à primeira premissa: “Deus deve ter uma explicação para sua existência”

Em princípio, a primeira premissa pode parecer vulnerável de um modo bem evidente.  E tudo que existe tem uma explicação para existir, e Deus existe, logo Deus deve ter uma explicação para sua existência! Mas isso parece estar fora de questão, pois a explicação para a existência de Deus exigiria a explicação da existência de outro ser maior do que Deus. Uma vez que isso e impossível, a primeira premissa deve ser falsa. 

Algumas coisas devem ser capazes de existir sem que haja qualquer explicação para isso. Um cristão diria que Deus existe de forma inexplicável. O ateu diria: “Por que não para o universo? O universo simplesmente existe, de forma inexplicável”. Com isso, parece que chegamos a um beco sem saída.

Resposta à objeção anterior: “Certas coisas existem necessariamente”

Vamos mais devagar! Essa evidente objeção a primeira premissa se baseia em uma compreensão equivocada do que Leibniz quis dizer por “explicação”. Na visão dele existem duas classes de coisas: (a) as que existem necessariamente e (b) as que são geradas por alguma causa externa. Vou explicá-las.

(a) As coisas que existem necessariamente existem por uma imposição ou necessidade de sua própria natureza. Para elas é impossível não existir. Muitos matemáticos acreditam que os números, os conjuntos e outros entes da matemática pertencem a essa classe de coisas. Eles não são causados por outra coisa; apenas existem pela necessidade de sua própria natureza.

(b) Por contraste, as coisas que têm sua existência causada por outra não existem necessariamente. Elas existem porque algo além delas as gerou. Objetos físicos conhecidos, como as pessoas, os planetas e as galáxias pertencem a essa categoria de coisas.

Portanto, quando Leibniz diz que tudo que existe tem uma explicação para existir, essa explicação pode se encontrar ou em uma necessidade da natureza da própria coisa ou em alguma causa externa. Assim, a primeira premissa poderia ser expressa de forma mais completa da seguinte maneira:

1. Tudo que existe tem uma explicação para existir, seja essa explicação uma necessidade da própria natureza da coisa ou uma causa externa.

Mas com isso a objeção acima cai por terra. A explicação para a existência de Deus se encontra na necessidade da própria natureza de Deus. Como até um ateu reconhece, é impossível que Deus tenha uma causa. Logo, o argumento de Leibniz é na verdade um argumento em favor de Deus como um ser necessário, não causado.

Longe de diminuir o argumento de Leibniz, a objeção ateísta a primeira premissa na verdade ajuda a esclarecer e engrandecer quem Deus é! Se Deus existe, ele é um ser que necessariamente existe, que não é causado.

Defesa da primeira premissa: “Tamanho não importa”

Então, que razão podemos oferecer para alguém pensar que a primeira premissa é verdadeira? Bem, quando você começa a refletir sobre essa premissa, percebe que ela é uma espécie de premissa evidente em si mesma. Suponha que você esteja atravessando uma floresta e se depare com uma bola translúcida bem no meio da floresta.

Sua reação natural seria se perguntar como aquilo foi parar ali. Se alguém que estivesse com você dissesse, “Ora, isso apenas existe, não tem uma explicação. Não se preocupe com isso!”, você pensaria uma dessas duas coisas: que essa pessoa estava maluca ou que só estava querendo seguir em frente. Ninguém levaria a sério a sugestão de que aquela bola existia e estava lá sem nenhuma explicação, literalmente.

Suponha agora que você aumente o tamanho dessa bola e ela passe a ser do tamanho de um carro. Isso não mudaria em nada a exigência de uma explicação para ela. Suponha que ela seja do tamanho de uma casa. Continua havendo a mesma necessidade de explicação. Ou que ela seja do tamanho de um continente ou de um planeta. A mesma coisa. Suponha que ela seja do tamanho do universo inteiro. A necessidade de explicação continua. Meramente aumentar o tamanho da bola não afeta em nada a necessidade de uma explicação.

A falácia do táxi

As vezes os defensores do ateísmo dirão que a primeira premissa é verdadeira para tudo que esteja no universo, mas não acerca do universo em si. Tudo o que existe no universo tem uma explicação, mas o próprio universo não tem.

Contudo, essa explicação comete algo que tem sido chamado de “falácia do táxi”. Como costumava dizer com sarcasmo Arthur Schopenhauer, filosofo ateu do século XIX, a primeira premissa não pode ser dispensada com um aceno de mão, como se dispensa um táxi depois que se chega ao destino desejado! Não se pode dizer que tudo tem uma explicação para existir e, de repente, tirar o universo fora disso. Seria uma atitude arbitraria da parte do ateu se ele alegasse que o universo é uma exceção à regra (lembre-se que o próprio Leibniz não fez de Deus uma exceção à regra da primeira premissa).

A ilustração que demos acima com a bola na floresta mostrou que o simples fato de aumentar o tamanho do objeto a ser explicado, mesmo que ele chegue ao tamanho do universo inteiro, não anula a necessidade de haver alguma explicação para a sua existência.

Observe ainda o quanto essa resposta do ateísmo não é cientifica. Pois a própria cosmologia (estudo do universo) atual se dedica a busca de uma explicação para a existência do universo. A atitude ateísta mutilaria a ciência.

Outra falácia ateísta: “E impossível que o universo tenha uma explicação”

Assim, alguns defensores do ateísmo tentaram arrumar uma justificativa para fazer do universo uma exceção à primeira premissa. Eles disseram que é impossível que o universo tenha uma explicação para sua existência. Por quê? Porque essa explicação teria que ser um estado de coisas anterior no qual o universo ainda não existia. Mas isso seria o nada, e o nada não pode ser a explicação de algo que existe. Assim, o universo deve somente existir, de forma inexplicável.

Essa linha de raciocínio é uma evidente falácia. Pois ela assume que o universo seja tudo o que existe, de modo que se o universo não existisse, haveria o nada. Em outras palavras, a objeção presume que o ateísmo seja verdade! Os ateístas, portanto, estão cometendo uma repetição de principio, argumentando em círculos.

Leibniz concordaria com a colocação de que a explicação do universo deve estar em um estado de coisas anterior à existência do universo. Mas esse estado de coisas anterior é Deus e sua vontade, e não o nada. 

Parece-me, portanto, que a primeira premissa, em termos plausíveis, é mais verdadeira do que falsa, e isso é tudo que precisamos para um bom argumento.

(Continua...)


Willian Lane Craig

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